É impossível que em 2010 quem use a internet nunca tenha ouvido falar no Facebook. Pode não ter conta na rede, achar bobagem e tudo, excesso de exposição – mas, já ouviu este nome, pelo menos. Rede social, dirigido por David Fincher (de O Curioso Caso de Benjamim Button e Clube da Luta), conta a história da criação deste fenômeno, pela dupla de amigos Mark Zuckerberg e Eduardo Saverin. A proposta do post é partir do filme para refletir sobre o impacto das redes sociais na sociedade. Na sua vida. Sem nenhuma pretensão acadêmica, abrindo o diálogo com você.

O filme se baseia no livro Bilionários por acaso, de Ben Mezrich. O título em inglês inclui “The Founding of Facebook: A Tale of Sex, Money, Genius and Betrayal“. Mas, ao contrário do que sugere, o sucesso da rede não foi casual. Tudo foi planejado para dar certo – talvez não na dimensão e velocidade imaginadas inicialmente. Zuckerberg rapidamente enxergou para onde tudo podia ir.

Saí do cinema pensando na personalidade de Mark, em qual categoria do CID-10 ele se encaixaria, se passasse por uma boa avaliação psiquiátrica. Mas, ao começar a pesquisar sobre a história real, vi que iria cair numa crítica superficial, facilmente derrubada por qualquer pessoa que conhece melhor a história real. Sabendo que o livro foi escrito a partir do contado pelo ex-melhor amigo de Mark Zuckerberg , Eduardo Saverin, tem que se dar um desconto ao viés do ressentimento. Soube que Zuckerberg tem um relacionamento estável desde o início do curso, não sendo tão antissocial como parece. É possível que só Mark e Eduardo conheçam a história completa. Saber que a versão era de alguém que se sentiu traído mudou minha linha de análise. Cheia de cautela, aceito palpites de quem conhece mais da história real… 🙂 Então, vamos lá: Mark e Eduardo, o amigo brasileiro, estudantes de Harvard, criaram o Facebook em 2003.


Ah, aqui embaixo está o verdadeiro Mark, que veio ano passado ao Brasil e se mostrou, para alguns internautas, pouco conhecedor do perfil do usuário brasileiro. A rede social mais popular por aqui ainda é o orkut, mas ele declara que isto é questão de tempo e conhecimento. Pelo número de pessoas que vão abandonando o orkut, acho que ele tem uma certa razão. O boom do orkut já passou, tendo entrado na fase do declínio – a menos que se reinvente (o que não é de todo impossível). Caso não queira saber muito sobre o filme, não leia, tem spoilers pela frente. E nem veja os trailers… 😀

Os diálogos dos primeiros minutos do filme são incrivelmente ágeis. Zuckerberg nos parece um gênio logo de cara – um gênio malvado, sendo bem ‘maniqueístas’. Caracterizado como um nerd típico, mal adaptado (ou mal resolvido?) a cena de abertura mostra seu papo com a namorada no bar. Enredado nas suas próprias ideias, ntelectualmente vaidoso, arrogante, impiedoso, inábil, é incapaz de ouvir o que esta tinha para dizer. Ou melhor, ele escuta, registra, mas não dá atenção. Acha-se o centro do mundo . Humilha sem pensar duas vezes.

Quando recebe um fora, ao invés de lamber suas feridas, tem uma ideia incrível . Sua vingança é perversa, para o deleite dos rapazes e ódio das moças de Harvard. Contando com Eduardo, outro geniozinho, em poucas horas, congestiona a rede da universidade, que sai do ar. Sua brincadeira o projeta entre os alunos, que é o o que sempre quis: ser admitido nos “clubes”. Assim, atrai a atenção de clientes e é contratado para desenvolver um projeto que eles imaginaram, mas não sabiam desenvolver. Mal sabem eles que, logo de cara, tocaram em um ponto sensível do rapaz: a exclusão.

A ideia do trabalho é boa, mas, Mark, ao assumir o trabalho, mostra-se o típico ‘enrolão’, que todo mundo já contratou alguma vez. Revolta pura contra seus contratantes, que fazem parte de um mundo em que ele não tinha sido ainda admitido. E não por falta de competência. E a percepção de que tem um tesouro por explorar. Zuckerberg aprimora a ideia, bolando algo muito melhor: The Facebook. Mais uma vez, conta com a ajuda de Eduardo. Só que The Facebook entra no ar como concepção sua, infringindo os códigos de ética mais elementares – o que enfurece seus contratantes, que correm atrás do prejuízo.

Terá sido o carisma do ator (Jesse Eisenberg, de O solteirão e de A Lula e a Baleia), que me despertou a empatia pelo jeito moleque de Zuckerberg? Pode ser apenas liberdade ficcional, mas mesmo os foras que dá não deixam de ser ‘merecidos’, apesar de nem um pouco diplomáticos. Ele cala os adversários com a objetividade de suas respostas, muitas vezes, como dá pra ver no trailer.



Mas, sempre alerta: não se pode achar que se conhece Zuckerberg, só pelo filme. Zuckerberg fica caracterizado como um traíra, na melhor dos adjetivos. Afinal, é a visão de Eduardo sobre o caso, com boa dose de ressentimento. O brasileiro foi ficando de lado quando conhecem o criador do lendário Napster, Sean Parker (interpretado pelo cantor Justin Timberlake). Parker é retratado como um interessado em surfar no sucesso do ‘ingênuo’ criador. Parker mostra um mundo que Zuckerberg não conhecia, e acena com a possibilidade de ser aceito em círculos que não frequentava. Teve grandes ideias também – e uma foi suprimir o artigo “The”. Simple like that… . Eduardo, a princípio, não parece apostar tantas fichas assim na rede, partindo em busca de um estágio. É no seu afastamento que Parker consegue crescer e influenciar Zuckerberg, fascinado por ele.


Antes de pensar no que o Facebook mudou sua vida ou na das pessoas que você conhece, há que se reconhecer que foi o orkut, aqui no Brasil, que começou a revolucionar a vida do brasileiro, lá pra 2004. A proposta era exclusivista: só entrava quem era convidado. A versão inicial em inglês excluía muitos brasileiros. As comunidades ampliaram o círculo social, fizeram pessoas se reencontrarem, outras se conheceram – enfim, movimentou a vida social de muita gente que não tinha uma. Claro que isto teve um impacto nas relações amorosas dos grandes centros urbanos, por aqui. Muita gente casou , separou ou traiu, graças à criação do engenheiro turco, Orkut Buyukkokten. O sucesso fenomenal ficou mais restrito ao Brasil – e à Índia ;).

Aliás, uma cena do filme é muito interessante: quando a namorada de Eduardo pergunta porque o status dele no Facebook era solteiro – se eles eram namorados ainda. Na vida real, costuma ser questão para muita gente e realmente pode revelar um grau de comprometimento maior ou menor. Li estes dias o depoimento de um homem, apavorado. Após uma transa casual, que não pretendia levar à frente, descobriu que sua parceira trocara o status, colocando “em relação séria”. No mínimo, gera boas questões para a análise… 😉

Hoje em dia, é o Facebook que está crescendo vertiginosamente (em outubro, segundo o Ibope, tinha 33% dos internautas, acima de 18 anos. O orkut ainda tinha mais – 70%). Nesta pesquisa Ibope (disponível em http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=6&proj=PortalIBOPE&pub=T&db=caldb&comp=pesquisa_leitura&nivel=null&docid=44602A95C63EC50A832577C30049926A ), fica claro que o usuário brasileiro usa muito mais a rede como diversão e para encontrar os amigos do que com motivos profissionais.

O uso intenso das redes sociais desperta a atenção das águias do mercado publicitário, que não perdem a chance de quererem colocar seus produtos em todas as mídias possíveis. E sempre vale lembrar que recrutadores muitas vezes descartam candidatos a empregos se tiverem acesso a seus perfis e descobrirem conteúdo não apropriado por lá.

Preciso dizer que considero um filme “must see“? Quem navega e principalmente quem tem conta no Facebook deve ver. No mínimo, para ficar atualizado: o filme tem 6 indicações para o Globo de Ouro e aposta-se que terá também várias ao Oscar. Quem ainda não sabia que o mundo não é cor de rosa, vai descobrir vendo este filme, podendo prestar atenção à sua participação e como alimenta toda esta engrenagem. Muito poderia ser dito ainda sobre o filme, sobre a necessidade hoje dos jovens de conquistarem seu reconhecimento tão rapidamente, independente do que precisem fazer por isto. Das relações ali retratadas poucas mostram vínculos de amizade ou amor. São todas interesse puro. Será que é isto o que está acontecendo no mundo real, também? Será que o virtual só está refletindo o que já é?

Concorda ou discorda? Opine, clicando no título lá no alto, para abrir a caixa de texto aqui embaixo. Assim que eu for notificada, seu comentário entra no ar.

Vendo por um outro ângulo… The Facebook
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10 ideias sobre “Vendo por um outro ângulo… The Facebook

  • 21/12/2010 em 16:24
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    Sinto dizer, mas é o mundo real. Mundo de negócios, mundo de venda, mundo de interesses. Mas existe vida fora da “terra”, eu acredito.

  • 21/12/2010 em 16:24
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    Qualquer filme que v. veja de David Finch sabe que um dos temas mais caros de suas obras é A SOLIDÃO HUMANA. Benjamim Button viveu uma vida na contra-mão e lutou sempre para ser aceito da maneira que era. Entendeu a vida desde que nasceu, pois já tinha nascido velho, e percorreu seu caminho apostando em valores importantes para a convivência humana. Morreu nos braços de sua amada.
    Zuckerberg, ao contrário, não se relaciona. Simplesmente duela, combate , desfaz de seus competidores. Não se interessa por eles. São apenas subalternos onde ele pode implementar sua superioridade tecnológica. Mas coitado….depende apenas de um SIM da namorada que o deixou. Fica olhando aquela geringonça que inventou à espera de um SIM, redentor. Mesmo ^dono^ de um bilhão de ^amigos^ vituais ele depende daquele SIM para pacificar sua alma e não se sentir rejeitado.
    Mesmo em duas histórias onde a fábula e a realidade debatem temas interessantes, atuais e intrinsecamente ligados a nossa realidade, o diretor passa direitinho seu recado. Nem a máquina mais poderosa nem amigos virtuais podem aplacar a Solidão Humana.

  • 21/12/2010 em 16:24
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    Olá Thays, como disse no blog, esta é a visão do Eduardo, não do Mark. Outra coisa, recentemente li em algum lugar- não lembro onde- que a tal namorada nem existia, segundo Mark. O que realmente chama a atenção é a importância da rede social na vida das pessoas, como o seu exemplo do cara que saiu com a garota para algo casual.

    É isso, abs

  • 21/12/2010 em 16:24
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    Luiza, você teve uma visão bem pessimista, né? eu to até agora pensando como a história pessoal dele acabou se misturando com todas as nossas… obrigada pelo comentário!

  • 21/12/2010 em 16:24
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    Henrique, achei bem precisa esta sua análise. Não tinha visto os paralelos dos protagonistas, bem legal. Obrigada por compartilhar suas ideias!

  • 21/12/2010 em 16:24
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    oi, Eduardo, obrigada pelo comentário. É, acho que tem muita gente embarcando na onda de demonizar o Mark e a gente tem de relativizar. Vamos ver se ele se dá ao trabalho de escrever uma réplica.
    Grande abraço!

  • 18/03/2011 em 16:24
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    A historia retratada no filme pode não condizer com a realidade, mas pelo menos, se analisando como cinema, se sai otimamente, principalmente pela direção do Fincher.

    mas é bom ver que o cinema sirva como um leque, abrangendo outras áreas, gostei muito da sua análise!

  • 19/03/2011 em 16:24
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    Oi, Diego

    concordo totalmente! gostei muito do filme – como acho que percebeu. Só fiz esta ressalva porque ouvi muita gente ‘teorizando’ sobre Zuckerberg sem o conhecer e sem saber que a versão é totalmente parcial… Mas, claro, deve ter muitas verdades…

    Obrigada e volte sempre. Vou tentar atualizar o blog… rsrsrs

  • 23/11/2011 em 16:24
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    Olá Thays,
    Estava procurando uma resenha que abordasse o filme pelo lado psicológico e encontrei seu artigo. Estou fazendo uma análise para um trabalho acadêmico e queria ter uma abordagem mais psicológica. Achei muito interessante seu artigo e o questionamento em relação a unilateralidade do filme, uma vez que quem conta é a parte ferida.
    Acho inclusive que Sean foi o mais malévolo de todos, manipulando Mark e o envolvendo numa teia para fazer o que ele queria. Talvez Mark não fosse tão perverso assim … realmente a história real somente Eduardo e Mark conhecem.

  • 25/11/2011 em 16:24
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    Oi, Luna
    tanta coisa já se passou depois do lançamento do filme, tantos movimentos políticos se beneficiaram da ‘rede’. Surgem muitos comentários hoje sobre o uso do Facebook em termos políticos, comerciais. E tenho visto como as pessoas têm usado como ‘terapia’ ou fuga de seus problemas sociais.

    Acho que naquele trio ninguém é totalmente ‘santo’ ou ‘demônio’… talvez no início não soubessem mesmo o potencial e as proporções do negócio. Agora, já perderam a ingenuidade, muito provavelmente.

    Espero que volte por aqui e conte como foi o seu trabalho. Boa sorte!

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